Opiniões

Os planos para povoar Marte

Muito se tem falado sobre as pesquisas em Marte, sobre possibilidades de nós, terráqueos, habitarmos o planeta vermelho em um tempo da Terra, ou seja, contado em anos e não com as medidas astronômicas, em milênios, em milhões de anos. Até porque não só a Nasa – a Agência Espacial norte americana – e alguns empresários ricos estão pensando nisso. A China entrou de vez nessa corrida, ocupando lugar que no século passado foi da União Soviética, esfacelada em 1989. A Rússia tentou manter a mesma pegada na concorrência com os americanos, como fazia nos tempos da Guerra Fria, mas perdeu espaço. A China, inclusive, acaba de mandar para o espaço um robozinho, o Zhurong, que é a sensação do momento, escarafunchando a superfície do planeta vermelho. E os Emirados Árabes também entraram nessa disputa e já têm em andamento a sua missão para explorar o inóspito vizinho.

Se os planos de povoar Marte com terráqueos derem certo, esperemos que os seus empreendedores se lembrem de que tiveram de construir o meio ambiente capaz de permitir a subsistência da vida a partir do zero. Aqui tivemos que esperar milênios para entender como funciona a vida e a sua relação com as estruturas naturais. Agora sabemos que dependemos de clima ameno, com temperaturas suportáveis, e de um sistema capaz produzir oxigênio e manter a água. Sabemos que as florestas são as responsáveis, tanto as dos continentes como as dos oceanos, pela composição do ar que respiramos. Sabemos tudo isso, mas não adiantou muito. Estamos destruindo os meios naturais de suporte da vida a passos largos, apesar dos alertas dos cientistas, dos apelos de combativas ONGS de proteção ambiental e de um pequeno grupo de corajosos ambientalistas autônomos.

No Brasil, ninguém parece se importar com essas questões, salvo as exceções referidas. Certamente por falta de informação. Para o governo federal atual parece que é questão de honra se transformar no maior destruidor de florestas e ecossistemas de todos os tempos! Os demais governos (estaduais e municipais), com alguma exceção, não têm se importado também. Todos os meses batemos recordes de desmatamento, de queimadas, de extinção de espécies. E o trabalho é organizado: são atacados os cerrados, a Mata Atlântica, a Floresta Amazônica, as restingas, o Pantanal, a caatinga, as áreas de preservação marítimas.

Alguém poderia objetar: ‘todos os povos fizeram isso ao longo de toda a história. A Europa fez isso com as suas florestas…’ É verdade. Os europeus fizeram isso, sim. Mas não fazem mais. Hoje estão replantando as suas florestas. E ajudando os países mais pobres a fazerem o mesmo, a preservarem as que têm. O Brasil recebia até 2019 em torno de 50 milhões de Euros por ano através do Fundo Amazônia, doados pela Noruega e pela Alemanha para ajudar na preservação da floresta. O governo atual dispensou a ajuda por não ter interesse na preservação ambiental. Mas alegou que Alemanha e Noruega estavam comprando a Amazônia a prestações… Uma ironia sem graça e nenhum fundamento.

Outra questão importante: há algumas décadas, o desmatamento era feito a machado, depois com motosserra. Hoje é feito com alta tecnologia, com máquinas que destroem imensas áreas num só dia, além do uso do fogo. E o mais grave: com total apoio dos governos. Portanto é muito sério o que estamos permitindo que seja feito com nossas florestas nos dias atuais. Sem contar que está havendo genocídio, com a destruição de várias nações indígenas que ocupam na Amazônia.

Mas voltando ao assunto central, sobre a povoação de Marte. Esse panorama nos causa uma preocupação: será que daqui a alguns anos vão fazer o mesmo com Marte? Criar um sistema parecido com o da Terra, para em seguida retrocederem e começarem a destruí-lo? Há uma esperança, pelo menos, de que isso não ocorra: os habitantes de Marte serão altamente tecnológicos e chegarão lá sabendo de tudo que precisam para manter a vida. Mas terão de ter muito cuidado para não levar infiltrados na população, os negacionistas da ciência, os “terraplanistas” e os gananciosos que estão destruindo tudo por aqui. Mas o que precisa ser dito mesmo é que a Terra é de todos nós e precisamos cuidar dela. Qualquer que seja o governo, devemos exigir que cuide do meio ambiente, porque isso não é questão ideológica, de coisa da direita ou da esquerda comunista, mas uma condição de subsistência da espécie humana. Ou seja, de nós mesmos. E das demais espécies também, claro. Elas também importam.

Mas pelo que temos visto, parece que o retrocesso é uma espécie de charme do momento por aqui. Seria um estigma da espécie humana? Evoluir até certo ponto, depois retroceder, voltar à idade da pedra? Até o astronauta brasileiro, o Ministro da Ciência e Tecnologia, tem ajudado na extinção da pesquisa no Brasil, ao aceitar que sejam retirados recursos da sua pasta. E tem participado de motociatas presidenciais sem máscara, ajudado nas aglomerações presidenciais… Só falta ele começar a dizer que a Terra é plana!

Dr. José Borges

Advogado (Formado em Direito pela Faculdade de Direito de Franca); especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil e em Direito Ambiental. Foi Procurador do Estado de São Paulo de 1989 a 2016 e Secretário de Negócios Jurídicos do Município de Franca. É membro da Academia Francana de Letras.

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